“Educação não transforma o mundo.
Educação muda pessoas.
Pessoas transformam o mundo”.
Paulo Freire
A Faculdade de Direito de Alagoas (FDA-UFAL), na comemoração de seus 80 anos, recebeu uma notícia desagradável de grande repercussão pelas mídias locais, alunos e professores da instituição: a baixa aprovação no exame da ordem dos advogados do Brasil, com a conseqüente queda de 18 posições que ocupava no ranking das universidades de direito do país. A princípio, o que pareceu assustador, preocupando a forma pela qual se dá a construção do ensino jurídico aos futuros bacharéis alagoanos, é reforçado pela a mercantilização da educação, que transforma o estudante em um cliente, seja ele no âmbito público ou privado. Dessa forma, o cliente passa a ser transformado em números, dados e estatísticas.
São conhecidas algumas informações veiculadas de descrença no teste da OAB, dos lucros que a instituição angaria com esse processo, ou da impossibilidade de avaliação do conhecimento de um estudante por meio de uma prova específica. Por isso, trataremos aqui, de outro ponto de vista, a da formação jurídica a qual os discentes estão submetidos. Não se quer, com isso, justificar um “fracasso” da universidade da qual fazemos parte para conforto próprio ou dos que possam vir a ler o texto. Acreditamos, porém, que a preocupação e cobrança social não devam partir exclusivamente de um exame pontual aplicado ao fim do curso, que pouco prioriza a produção acadêmica e pode ser solucionado com estudos em um cursinho preparatório.
Sendo o Direito uma ciência social aplicada, este deve ser aprendido e compreendido no seio da sociedade. Portanto, um bom profissional do direito (rechaçando-se aqui o uso do “operador” do direito – direito não é máquina!) deve ser bem mais do que um simples banco de dados resultante de cinco anos de estudos e exames avaliativos dentro da faculdade. Logo, criticamos aqui o fato de acreditar-se que os bons estudantes são aqueles que tiram as maiores notas exclusivamente por decorarem aquilo que anotaram durante as aulas, estes não são bons estudantes e sim, reprodutores. Nossa concepção de educação perpassa os limites da sala de aula, isto é, o aluno não é um mero recipiente no qual o professor deposita seu conhecimento, ou seja, ela deve ser construída também tanto pelo estudante quanto fora da universidade.
Ao analisarmos o índice de desenvolvimento do estado de Alagoas, percebemos que não estamos numa boa posição e que, inclusive, nossa educação é uma das piores do país, bem mais estranho do que um índice de baixa aprovação no exame da OAB são estes. Porém, o que temos feito para reverter a situação, ou será que estudamos uma ciência humana apenas para lidar com o técnico? E o que os bacharéis com carteira da Ordem têm feito?
Recorremos ao artigo 207 da Constituição Federal, garantidor da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, o tão citado, mas pouco conhecido, “tripé universitário”. É bem verdade que o exame da OAB não dá qualquer valor aos dois últimos, logo, percebe-se que para a formação de um advogado ordinário, o único requisito é um ensino jurídico básico. Ainda com a existência de uma norma que assegure essa indissociabilidade o que se têm feito? Pouca coisa. Os TCC’s (quando obrigatórios), na maioria das vezes são reproduções do que doutrinadores já falaram; as extensões pouco dialogam com a sociedade, cabendo poucos exemplos louváveis de efetivas extensões. Aliás, são poucas as instituições privadas que conhecem esse tripé.
Não é a toa que, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, o Brasil possui mais faculdades de direito do que o resto do mundo. A ausência de laboratórios, máquinas para estudos e o alta procura no “mercado da educação”, possibilitaram a explosão do curso que só necessita de uma sala de aula, um professor e clientes. Atenta-se para o fato de que fechar faculdades contribui somente com a restrição da educação para os que querem ter acesso a ela. É necessária uma fiscalização contínua do Ministério da Educação, que evite fraudes já conhecidas.
O Brasil obedece a uma lógica de mercado, cujo objetivo não é mais formar profissionais críticos, que saibam lidar com as mazelas sociais, buscando soluções conjuntas com a sociedade, mas sim, formar pessoas prontas para o mercado de trabalho, concurseiras, que se utilizem do ensino do direito enquanto forma de ascensão social, que permanecem em seus condomínios privados, cercas elétricas e carros com vidro fumê, crendo ser a “realidade” vista nos noticiários tão distante quanto as ficções da teledramaturgia.
Valorizar nossa educação jurídica não é adequá-la às provas do exame da ordem. Caso seja baseado em uma prova que avalia apenas o ensino jurídico e a capacidade de nossos estudantes de direito em assimilar e reproduzir o conteúdo numa prova, a solução é transformar as faculdades em grandes empresas de cursinho, fenômeno já conhecido pelos estudantes que passam pelo vestibular - acostumados a macetes e questões específicas da prova que quer prestar. Se ainda tivermos preocupações com a nossa população alagoana, com os abismos econômicos existentes e a idéia de injustiça social, o caminho é lutar por uma nova educação jurídica. Uma educação que não priorize a OAB, mas a tenha como conseqüência de um processo de formação educacional dos novos operários do Direito, preocupados, de fato, com a transformação social.