Quando
criei o blog, a intenção era que fosse um espaço de escrever
pensamentos e bobeiras da vida. Nem isso deu certo. Depois da
empolgação primeira, faltou inspiração e só postei dois textos.
Retomando a ideia, ainda que falte inspiração, não faltará história pra contar.
Ainda que a gente
desconsidere a fase pré-intercâmbio e torça para que chegue logo a
grande data da viagem, os momentos que antecedem são essenciais.
Escolha da Universidade, Processo Seletivo, Passaporte, Visto, Malas,
Previsão do Tempo, tudo contribui para deixar a viagem mais nervosa
e garantir aquele frio na barriga.
Aleatoriedades,
rotinas e fugas.
Uma vez li em algum
lugar – tipo aqueles livros “ajude a melhorar seu cérebro” que
você lê durante o pré-vestibular – que era preciso forçar
mudanças para estimular melhor a capacidade cognitiva. Não entendo
muito disso (nem quis), mas “alternar os lados pelos quais se
começa a escovar os dentes”, “pegar caminhos diferentes para
chegar em casa”, “sentar em lugares diferentes no ônibus, na
mesa da cozinha...”, sempre me pareceu algo divertido e desafiador.
Não que isso tenha alguma relação com passar seis meses em Porto,
mas talvez explique um pouco do meu desapego e de tentar ver lado bom
nas mudanças, mesmo que sofridas.
O interesse por
viagens foi estimulado por meus pais. A gente sempre viajou, muito
mais por Alagoas e o Nordeste. Ficando mais velho e construindo uma
formação política, comecei a acompanhar os encontros e construir a
FENED. Balanço: cinco regiões do Brasil conhecidas. Pará, Ceará,
Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Sergipe, Minas Gerais, Rio
de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul. Conheci um pouco das
caras, sotaques, belezas e mazelas do Brasil.
“Ela não merece
esse prêmio, e para destruir o dela, eu quero o meu primeiro” e
a Geração Y.
Algumas pessoas me
perguntam como foi que a ideia do intercâmbio surgiu. Para quem quer
ter a oportunidade de ir por meio de uma bolsa, a exemplo do
Santander e do Ciência$ sem Fronteira$, é importante sempre
observar os editais de mobilidade que abrem na UFAL (F5 no site da
Assessoria de Intercâmbio sempre). Além dessas, existe também a
opção do próprio intercambista se bancar. Do formulário de
candidatura para a Universidade do Porto, pelo que observei, existe
uma gama de opções para quem tem o interesse de estudar por lá.
Um pouco de história.
Durante as calouradas (aquele período em que a gente tá mais
preocupado em tirar a “nhaca” de ensino médio e decorar os nomes
“das pessoas que vão passar cinco anos com você” do que prestar
atenção no que acontece nas oficinas), sempre citam a mobilidade
acadêmica. Eu também deixei passar despercebido. Algumas pessoas
foram falando sobre, e meu interesse começou a ser despertado.
Mas com tanta gente
boa, seria quase impossível conseguir uma bolsa, o que me deu uma
desanimada e me fez retomar o curso natural da vida, principalmente
porque o critério sempre fora o coeficiente (uma média ponderada
das notas acumuladas ao longo do curso). Minhas frustrações com o
direito nunca me permitiram um coeficiente maior do que 8,5, numa
sala de “coeficiente ostentação”.
Essa frustração com
o direito meio que me empurrou a conhecer novas faces. Centro
Acadêmico, Projeto de Extensão, Projeto de Pesquisa, Movimento
Estudantil... Imperceptivelmente, acumulei experiências válidas
também para o currículo. Foi aí que surgiu a oportunidade da
primeira tentativa: uma mobilidade para dentro do Brasil.
Depois de muitas
pesquisas e uns telefonemas (haha), decidi concorrer para a UFRJ e
bati na trave. Ótimo para a Ana (Aleijada), que teve uma das
melhores experiências da vida e brilhou no Rio de Janeiro.
Logo depois disso, a
FDA que mudava os critérios para aceitação de horas flexíveis,
definiu que criaria critérios para além do coeficiente na seleção
de bolsistas, estagiários e tudo que tivesse que selecionar. Ótima
iniciativa, por sinal, já que dá uma oportunidade, ainda que não
paritária (o peso é 5 para ensino, 2,5 para pesquisa ee extensão),
de estudantes extensionistas, pesquisadores e do movimento estudantil
também terem boas chances de serem selecionados. Surgiu o edital de
bolsas luso-brasileiras Santander, em que concorri e fui selecionado
como representante da FDA para a segunda fase.
A segunda fase é a
mais nervosa. Aquela em que te colocam de cara com todos os
concorrentes – que estão tão nervosos quanto você – para uma
entrevista com três professores. É aquela hora em que passam mil
coisas pela sua cabeça, em que mesmo que você tenha conversado com
outras pessoas que já passaram por esse momento, o corpo treme e
você se questiona se realmente está convencido de que deveria fazer
um intercâmbio e se sim, porque merecia mais do que as pessoas que
estavam ali.
Algo dolorido e não
saudável, principalmente quando, apesar de ser constantemente
bombardeado pelo individualismo e concorrência ferrenhos, você
tenta desconstruí-los. Certa vez, li um texto sobre a “Geração
Y” (pós “baby boom”) que apontava justamente como maior
defeito nosso, a crença ferrenha de que “se é diferente dos
outros e possui um diferencial: é tudo uma questão de te
encontrarem/uma oportunidade pra você deslanchar”. Nada mais
errado. Nunca me desconvenci que, apesar de uma formação acadêmica,
a minha função é ser mais uma peça para fazer a engrenagem rodar,
o ponto está em desfazer a engrenagem, mas na base da coletividade.
Depois de notar que
todo mundo também estava meganervoso e desconfortável, por qualquer
motivo que fosse com a situação, fiquei mais aliviado. Sempre que
vejo pessoas nervosas, acabo me acalmando de alguma forma. A
entrevista foi bem tranquila: quais meus interesses, porque o
intercâmbio, que universidade, currículo, projetos de pesquisa,
extensão, monitoria... Dias depois, o resultado dos cinco
selecionados.
O mais legal é que
durante as entrevistas troquei umas – boas - impressões com três
dos selecionados, o que fez com que as angústias com passaporte,
compra de passagens, seguro de viagem, visto, carta de aceite, fossem
compartilhadas.
“Geraldo,
prepara o táxi que eu tô indo pra Paris agora”.
Para quem (como eu)
acredita que organizar uma viagem de intercâmbio seria tão simples
quanto qualquer outra viagem: ledo engano. Como tudo na minha vida,
tem que ser da forma mais dramática possível, na base do
sofrimento, chororô e roda-da-fortunisticamente.
De uma Carta de Aceite
que atrasou, aos mil documentos que se deve providenciar para tirar
um visto, uma discussão nível baixo com a moça do Consulado e o
gigantesco engarrafamento em Maceió por conta de uma obra, parecia
que o visto estava amarrado e a viagem miaria a qualquer momento.
Para o alívio – mais meu do que da nação -, saiu. Seis dias
antes da viagem, mas saiu. Que fique bem claro que essa angústia foi
dignamente compartilhada pelo “Ufal em Portugal”.
“Malas prontas,
tudo ok! E no caminho lado a lado, um passo errado tropecei”
A
viagem é amanhã, as malas tão prontas! Depois de tanta viagem, é
quase impossível não saber arrumar uma mala. Pesados embaixo,
cuecas e meias separadas, necessaire, calça com a ponta pra fora
para depois abraçar a mala e camisas de botão por cima das calças.
Quase um mantra. Seguido rigidamente.
A
maior surpresa foi ter redescoberto a necessidade de ter controle de
tudo. Antes que a mala tomasse forma, fiz mil listas. Do que levar,
do que comprar, do que não esquecer. Maior qualidade: pensar em tudo
e conseguir, por uma vez na eternidade, ser organizado. Maior
defeito: ser hipocondríaco e levar uma farmácia, o que me faz ter
medo de não passar nem na alfândega.
“A saudade é
companheira”
Saudade não se prevê,
se sente. E a medida em que for sentindo, compartilho. Agora é
aproveitar o restinho de tempo e aproveitar a epopeia dos seis meses
que começa amanhã.